Blogroll

Osmar Prado: “Eu fui para a guerra”


osmar prado (Foto: fábio cordeiro)

Conhecido pela pontualidade, Osmar Prado chega para o encontro com QUEM três horas depois do horário marcado. O atraso teve motivo mais que justificado: com o diagnóstico de um câncer de amígdala extremamente agressivo, o ator de 66 anos estava vindo do médico, de quem recebeu a notícia de que não tinha mais restrições a suas atividades, dois meses e meio após o fim do tratamento contra a doença. “Eu fui para a guerra”, diz ele, emocionado.


Foram duas cirurgias, três sessões de quimioterapia e 30 de radioterapia, nos intervalos das gravações de Amores Roubados, no Nordeste. Na minissérie da TV Globo, que estreou no dia (6), Osmar é Roberto, casado com Celeste (Dira Paes), mulher fogosa que trai o marido. Casado com a bailarina Vânia Penteado, 51, com quem tem a estudante de teatro Luana, de 19 anos, Osmar é pai, ainda, de Tainá, 31, que faz produção de cinema, e da atriz Janaína, 34, da união com Elizabeth Viana. Ao lado da filha mais velha, ele estará em Meu Pedacinho de Chão, próxima trama das 6 da Globo, na qual viverá um caipira – tipo já tão bem interpretado por ele na novela Renascer (1993), quando compôs o inesquecível Tião Galinha.



QUEM: Como descobriu o câncer?

OSMAR PRADO:
Em maio, fui fazer a barba e tinha um caroço no pescoço. Sabia que não era uma coisa legal. Fiz uma tomografia que apontou um tumor, e o médico marcou uma biópsia. Enquanto esperava o resultado, fui gravar Amores Roubados no Nordeste. Mas eu sabia que era câncer. Veio o diagnóstico e a necessidade de cirurgia para retirar o tumor.


QUEM: Você teve medo de morrer?

OP:
Não tenho medo da morte. Meu pai teve o mesmo tipo de câncer, na mesma idade, e morreu depois dos 80 anos.


QUEM: Do que teve medo?

OP:
De perder a voz, sofrer, ficar entrevado, perder a independência e dar trabalho aos outros. Disse ao médico: “Se a cirurgia for afetar minha voz, meu instrumento de trabalho, prefiro não fazer”. Depois, vieram as sessões de radio e quimioterapia.


osmar (Foto: fábio cordeiro)

QUEM: Teve sequelas?

OP:
Foi preciso sacrificar um nervo, o que limitou um pouco o movimento do braço esquerdo, mas isso não me impede de fazer nada. Tenho as queimaduras da radioterapia no pescoço e saí dos 62 quilos para os 54. Perdi o paladar, tudo tinha gosto metálico. A primeira coisa que comi e pude sentir de verdade o gosto foi sorvete de coco. Foi uma alegria.


QUEM: Durante seu tratamento, no que se agarrou?

OP:
É uma hipocrisia você se agarrar a algo só porque está naufragando. Descobriu que a finitude também te atinge e não só ao vizinho? Eu fui para a guerra e tive o amparo das pessoas que me amam. Optei pela vida, por lutar. Mas não me agarrei a balsa alguma, até porque aceitaria a morte, caso ela viesse.


QUEM: Você acredita em Deus?

OP:
Aí, eu te pergunto: que Deus? Não há um Deus só. Meus pais eram muito religiosos, mas fui me afastando da religião quando namorei uma menina que era estudante de filosofia.


QUEM: Você começou a atuar criança. Seus pais aprovaram?

OP:
Minha mãe era dona de casa e meu pai um modesto funcionário público e chofer de praça. Com 7 anos, perguntei o que se fazia para ser artista e ela me destruiu no nascedouro, porque o parâmetro de artista dela era o Rodolfo Valentino, símbolo sexual das décadas de 1920 e 1930 (risos).


QUEM: Como é o Roberto de Amores Roubados?

OP:
Ele é um exportador de mangas do sertão, apaixonado pela mulher, que é muito mais nova que ele, fogosa, e que não vai resistir ao personagem do Cauã Reymond. Mas é um casal que tem tesão, eles têm uma boa cama.


QUEM: Como é fazer esse tipo de cena?

OP:
O intérprete serve ao personagem. Não fico constrangido. O que não pode haver é espaço para o mau gosto.


QUEM: Isso mexe com a autoestima do ator?

OP:
Se eu tenho vigor e potencial para isso, eu vou ceder o meu potencial. Eu me sentiria mal se fosse um filme pornô, cuja proposta é despertar de forma grosseira a libido de quem vê. A minissérie tem uma discussão inteligente e de uma forma não machista sobre traição, embora ele tenha um comportamento machista porque o nordestino não vai aceitar, dizer “da próxima vez, me convida”.


QUEM: Você fez vários personagens dessa região. Tem uma relação afetuosa com o Nordeste?

OP:
Tenho uma relação afetuosa com o Brasil e facilidade para sotaques. Vou fazer sotaque caipira em Meu Pedacinho de Chão. Uma das músicas para o laboratório da novela foi Vingança do Chico Mineiro, de Tonico & Tinoco.


QUEM: Um ator com sua trajetória precisa de laboratório?

OP:
Não há possibilidade de representar sem uma pesquisa, isto é, enquanto você não for um burocrata da profissão.


QUEM: É verdade que conheceu Garrincha fazendo laboratório para a novela Bandeira 2 (1971)?

OP:
Fazia um jogador de futebol e fui treinar no Olaria, onde Mané estava encerrando a carreira. Tive o prazer de jogar um amistoso com Nilton Santos, Mané e Félix. Mané era uma criança, bebia e virava um demônio. A biografia sobre ele, do Ruy Castro, Estrela Solitária, resgata Mané e, até mais, Elza Soares, que tomou muita paulada por ser negra e favelada e ter sucesso.


osmar (Foto: fábio cordeiro)

QUEM: O que acha da polêmica das biografias não autorizadas?

OP:
Uma bobagem. Biografia não é para esconder porra nenhuma, é para mostrar. Se você se sentiu agredido, tem lei, processa. O que tem que ter é a participação do biografado. Eu abriria o jogo. É preciso que se contem as minhas virtudes e mazelas.


QUEM: Quais são as suas virtudes?

OP:
Sou sensível, não sou uma pessoa alienada. Tenho compromisso social com meu tempo e visão crítica do sistema. Sonho com uma sociedade que não veio ainda, mas que virá. As minhas hipocrisias... Fui de chutar porta de carro em briga de trânsito, de emparelhar e falar “desce, filho da puta!”. Já briguei em baile de Carnaval, Milton Nascimento e Dennis Carvalho são testemunhas.


QUEM: O gênio está amansado com a idade?

OP:
Amansado, não, controlado. Nunca deixei meu trabalho acomodar, quando queriam que eu fizesse o rame-rame, eu fazia o contrário. Na época de Renascer, tive problemas, mas jamais abri para a imprensa porque roupa suja se lava em casa. Por isso que a TV Globo me respeita e nunca me fechou as portas.


QUEM: Você está casado há mais de 20 anos. Há receita para a longevidade da relação?

OP:
Se você gosta, é parceiro. Se é parceiro, cuida. A convivência faz com que você fortaleça ou enfraqueça isso. Se é pra valer, só fortalece – e, cada vez mais, entre mim e Vânia, só fortalece. Conheci a Vânia quando ela fazia o espetáculo Oh, Calcutá e a vi pelada pela primeira vez no palco (risos). Eu queria namorar uma amiga dela, mas Vânia entrou em cena exuberante e me chamou a atenção. Confesso que a possível entidade divina desse movimento (do câncer) foi o fato de eu me dar conta do imenso amor que a Vânia demonstrou.


QUEM: Dois casamentos e três filhas. O que aprendeu sobre as mulheres?

OP:
Tive que conjugar minha feminilidade com a feminilidade e masculinidade delas. Eu fiquei rei nesse castelo. Nunca projetei que ia me casar, os pais das meninas que eu namorava ficavam horrorizados porque eu era ator. Teve um que disse: “Meu filho, você tem tudo para vencer na vida, o que estraga é essa mania de ser ator” (risos).


osmar (Foto: fábio cordeiro)

Comentários
0 Comentários

Nenhum comentário :

Postar um comentário

 

Parceiros

Blogger news

Copyright © . Principe Troll |